relato14

Eu tinha 21 anos, só havia beijado um menino aos 15, e nunca tinha namorado. Um jovem da igreja, que não era tão jovem quanto eu (tinha os seus trinta e poucos anos) começou a se aproximar, de maneira sutil, se dizia apenas meu amigo. Ele também falava que estava ajudando os outros meninos da igreja, que ficava feliz em ser uma referência para eles. E para completar, esse “homem de Deus” contava que tinha chamado pastoral e missionário. Eu, que sonhava com Missões, fui sendo seduzida por toda essa conversa.

Começamos a namorar, mesmo ele dizendo que eu não era o seu tipo, que eu era baixinha e as suas ex eram loiras e altas. Eu nunca havia namorado, não sabia como era. Ele me beijava e se esfregava em mim, eu achava estranho, não entendia direito o que acontecia. Ele começou a me tocar, de uma maneira que nunca ninguém havia me tocado. No começo eu fui me deixando levar pelo momento, depois fui me sentindo culpada e me afastando dos amigos e das pessoas da igreja. Eu queria conversar, ele dizia que não queria conversa. Aliás ele nunca queria ouvir, quando eu ia falar sobre os meus problemas ele dizia que não era nada demais e queria me beijar. Penso que para ele mulher não tinha que ter voz.

Chegou ao ponto de eu me sentir totalmente usada, um dia eu estava indo embora e ele me agarrou e ficou se esfregando em mim. Fui sozinha para o carro e voltei chorando para casa, como acontecia quase todas as vezes que nos encontrávamos.  Aos poucos fui ligando os pontos. Ele dizia que era virgem, e que algumas namoradas eram assanhadas. Culpava as mulheres, como todo homem machista. Em alguns de seus comentários ele dava a entender que eu era também assanhada, ou seja, culpada. Além disso, esse varão valoroso manipulava todas as situações para no fim fazer com que eu me sentisse culpada. Tanto fez que quando terminei o relacionamento pela primeira vez, a culpa que ele jogou sobre mim foi tão grande que eu acabei pedindo para voltar. Dizia que eu estava deixando ele no momento mais difícil de sua vida, que ele não ninguém. Mas foi só reatarmos o relacionamento para eu voltar a ser uma pessoa insignificante para ele. Foram tantas situações em que fui humilhada e oprimida que ao fim do relacionamento eu estava sem amigos, e emocionalmente desestruturada. Eu sentia nojo por tudo que ele havia feito comigo, por todas as mentiras e por todo o controle que fez com que eu perdesse alguns amigos e partes da minha identidade. Eu não podia rir alto demais, porque ele dizia ter vergonha de mim, não podia conversar sobre banalidades, porque era muito infantil, não podia conversar com um amigo, porque este estaria dando em cima de mim.

Mas, graças a Deus, eu saí desse relacionamento. Pude enxergar que eu não merecia passar por aquelas situações. E comecei a enxergar outras mulheres que estão inseridas num relacionamento onde não há respeito pela mulher, que passa a ser manipulada e oprimida. Ainda me pergunto como alguém como esse meu ex pode se denominar cristão, também questiono a falha da igreja quando se trata de defender a mulher. Me lembro que ao conversar com meus líderes me senti mais culpada. Não sei como lidar com a estrutura machista dentro das igrejas.

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One thought on “

  • 21 de setembro de 2017 em 02:05
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    A forma como os líderes aconselham , as vezes sutilmente ou sem ter plena consciência disso, e perpetuam relacionamentos abusivos dentro das igrejas é realmente perturbador! E isso é fruto de repetições de discursos que até podem nao ser machistas, mas as suas premissas os são. Não sei se há uma maneira de tratar sobre isso de forma saudável dentro das igrejas

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