Coretta King, a matriarca negra pelos direitos sociais e civis

Ela foi a primeira dama dos direitos humanos e ensinava que uma das formas para fazer a mudança passa por nos mudarmos a nós próprios de forma a sermos capazes de liderar os outros na direção que devem tomar.

 

Conhecer um pouco da história de Mrs Coretta King mudou minha percepção sobre o ser mulher negra evangélica. Há alguns anos, durante uma pausa nos estudos, procurei um título na internet para meu entretenimento. Na época, no início do Coletivo Vozes Marias, preferência a biografias e temas sobre gênero e feminismos. Encontrei um título que chamou atenção: “Betty e Coretta”[1].

A sinopse indicava se tratar da história das esposas dos maiores líderes da luta pelos direitos civis nos Estados Unidos nos anos 60: Malcon X e Martin Luther King. Imediatamente eu pensei: como eu não conheço essas mulheres? Como eu nunca ouvi falar delas no meio progressista evangélico? Em uma breve investigação por mais informações na internet, títulos de obras completas, capítulos ou revistas sobre sua vida e trabalho, pouco material foi encontrado em língua portuguesa.

A verdade é que Coretta, durante toda sua trajetória como ativista pelos direitos civis das pessoas negras nos EUA, também  foi militante pela causa dos direitos das mulheres e da população LGBT até o fim de sua vida. Sim, Coretta não foi coadjuvante.  Ela assumiu a defesa de bandeiras sociais que até hoje causam cólera a líderes das igrejas mais conservadoras e fundamentalistas, e reticências aos mais progressistas. E não seria por tudo isso que sabemos tão pouco sobre seu trabalho social e religioso?

Na juventude, participava da Associação Nacional para o Avanço das Pessoas de Cor (NAACP)[2]. Durante a vida adulta pela marchou e liderou junto ao movimento pelos direitos civis em EUA. Em relevância e destaque sabemos que fundou o Centro para a Mudança Social Não-Violenta com o nome do marido. Foi ativista pelo Movimento Pela Paz e Não Violência e contra a Guerra do Vietnã, e ainda lutou durante cerca de 15 anos para que fosse assinada a lei de feriado nacional homenageando ao Rev. Luther King.  Na velhice, foi voz porta-voz “contra a injustiça racial e econômica, defendendo os direitos das crianças e das mulheres, a dignidade dos homossexuais, a liberdade religiosa, as necessidades dos pobres e destituídos de poder, o pleno emprego, os cuidados de saúde e oportunidades de educação para todos, e também o desarmamento nuclear, a ecologia e uma constante consciencialização sobre os problemas da sida“.

A invisibilidade, omissões políticas e ocultamentos voluntários sobre a luta e perseverança das mulheres encontram um recôncavo bastante fértil em nossa tradição religiosa. Isso aconteceu à Mrs Coretta King. Pouco sabemos sobre essa mulher negra, cristã e politizada. Restringir sua personagem à figura de esposa leal e apoiadora é injusto e insuficiente com sua trajetória e a de milhares de mulheres negras em toda a diáspora.

Eu gostaria de compartilhar com vocês o meu profundo sentimento de fortaleza quando revivi a memória da existência desta mulher incrível. A biografia de Coretta[3] regou a minha esperança de mulher negra e cristã em viver minha fé e vincular meu trabalho social às causas menos populares no meio religioso conservador e fundamentalista, mas, de profunda legitimidade no amor e na ética pregada e vivida por Jesus Cristo. Reflete a firmeza de que não há erro em ser religiosa e ativista política.

Precisamos reviver e publicizar a memória de Mrs Coretta King como nossa ancestral que nos deixou um legado ímpar de militância anti-racista, anti-sexista, antidiscriminação sexual e  pela equidade de gênero. A voz hoje que ecoamos, não é nossa voz apenas, é a voz e o lugar da resistência ancestral desta mulher. A voz da mulher sábia que diz: “Fale a favor daqueles que não podem se defender. Proteja os direitos de todos os desamparados” (Pv. 31.8).

Referências

[1]  “Betty and Coretta” .< http://www.imdb.com/title/tt2375664/ >. Acessado em 20 de Janeiro de 2018.

[2] Associação Nacional pelo Avanço das Pessoas de Cor < http://www.naacp.org/>. Acessado em 09 de Janeiro de 2018.

[3] Em 1969 ela publicou a a10utobiografia “Minha Vida com Martin Luther King”, em Inglês.

Breve Biografia de Coretta King. In https://mujeresquehacenlahistoria.blogspot.com.br/2013/01/siglo-xx-coretta-scott-king.html < Acessado em 20 de Janeiro de 2018>.

Coretta Scott King Morreu a matriarca do movimento dos direitos cívicos da América. In https://www.publico.pt/2006/02/01/jornal/coretta-scott-king-morreu-a-matriarca-do-movimento–dos-direitos-civicos-da-america-61298 < Acessado em 20 de Janeiro de 2018>.

Centro Martin Luther King. In https://cmlk.org/ < Acessado em 5 de Fevereiro de 2018>.


Vanessa Barboza é Mulher Negra e Feminista, Pentecostal e Libertária, Co-fundadora do Coletivo Vozes Marias (Recife), Articuladora Local do Movimento Negro Evangélico (Recife), Ex-articuladora local da Rede Fale (Recife), Assistente Social, Mestranda em Educação, Culturas e Identidades (UFRPE/FUNDAJ) e membra da Igreja Batista em Coqueiral (Recife).


O conteúdo e as opiniões expressas neste texto são de inteira responsabilidade de sua autora e não representa a posição de todas as organizadoras e colaboradoras do Projeto Redomas. O objetivo é criar um espaço de construção e diálogo.

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