Transcrição RedomasCast 14 – As Vozes Femininas no Cristianismo (com Rute Salviano)

Você ouve este podcast na íntegra aqui

Transcript:

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(Abertura)

Bianca Rati: Sejam bem vindas e bem vindos a mais um RedomasCast! Este espaço onde discutimos assuntos relevantes pras mulheres, e pros homens também. Eu sou Bianca Rati, e nesse episódio que encerra a 2ª edição da nossa campanha do mês da mulher, eu e Luciana santos conversamos com a professora Rute Salviano pra falar um pouco sobre a pesquisa dela a respeito das mulheres na história do cristianismo.
Luciana Santos: Esse episódio que faz parte da campanha “O Podcast é Delas 2018” e eu convido você que tá nos ouvindo a conferir os outros episódios participantes dessa campanha procurando a hashtag #opodcastédelas2018 ou a hashtag #Mulherespodcasters.
Bianca: A gente também convida você que tá nos ouvindo a conhecer o nosso site projetoredomas.com, e lá temos textos, temos estudos bíblicos, temos outros podcasts que você pode ouvir. Além disso, nessa campanha do mês da mulher nós também publicamos diversos textos e estudos bíblicos tanto sobre mulheres da bíblia quanto mulheres da história do cristianismo. Também deixa aqui o seu comentário sobre o que você achou desse podcast e o que você também tem achado da nossa campanha desse mês. Não esqueça de compartilhar esse podcast com os seus amigos na sua rede social pra que mais pessoas conheçam não só o Projeto Redomas, mas também o trabalho da professora Rute Salviano que gentilmente veio conversar com a gente hoje.
Luciana: Aproveita e segue a gente também nas nossas redes sociais, no nosso Twitter @projetoredomas, na nossa página do Facebook: Projeto Redomas e também no nosso Instagram @projetoredomas. É isso.

Bianca: Bom Rute, seja bem-vinda! Obrigada por ter aceitado conversar com a gente, ter disponibilizado o seu tempo, é muito bom te ter aqui, é uma honra na verdade! Eu queria pedir para você se apresentar um pouco, falar um pouco da sua formação, da sua história, pro pessoal que porventura não te conhece, conhecer um pouquinho mais de você.

Rute: Bem, eu sou Rute Salviano Almeida, nasci em um lar evangélico, sou pernambucana e vim para São Paulo com apenas 9 meses de idade. Tão pouco conheço do meu estado, mas amo, tenho muito orgulho de ser nordestina. Nasci lá, mas cresci, estudei e trabalhei, casei e tive meus filhos em São Paulo, até que eu vim para Campinas. E aqui em Campinas surgiu uma oportunidade maravilhosa que foi de lecionar em uma Faculdade Teológica, e nessa Faculdade Teológica eu pude… (sempre que a gente leciona a gente aprende muito mais do que quando estuda). Então lecionando eu pude aprender muito mais e também podia fazer mais cursos. Eu sou licenciada em Estudos Sociais, aí eu fiz o bacharel em Teologia e com a minha especialização em educação cristã, depois eu fiz um curso de pós-graduação em História do cristianismo. Parti para o mestrado em Teologia, concentração em História da Igreja, e aí eu já comecei a pesquisa, e o amor e a paixão pela história das mulheres. Porque o meu tema na dissertação do mestrado foi exatamente sobre as mulheres, foi “Uma Voz Feminina na Reforma”. Foi o meu primeiro livro. Então daí que eu parti para a pesquisa desse assunto da história das mulheres no cristianismo. Na faculdade eu fiquei quase 20 anos, e eu lecionei muitas matérias: História do Cristianismo, Geografia Bíblica, Metodologia da Pesquisa, Religiões, Movimentos Religiosos, Filosofia da Religião… a gente era uma faculdade pequena, um professor se ausenta então você cobre, e foi assim um processo de muito aprendizado, porque você é obrigado mesmo a estudar e pesquisar. E eu quis  aprofundar meu estudo, aí eu parti então para o mestrado, para a pós graduação, fiz o curso de inglês para eu me sentir mais preparada até mesmo para escrever, e aí quando eu comecei eu não parei mais! (risos)

Bianca: Como é que começou o teu interesse mesmo? Você falou que a sua dissertação foi o seu primeiro livro, o “Uma Voz Feminina na Reforma”. Mas você sempre teve esse interesse sobre as questões relativas à história das mulheres, sempre foi uma coisa natural pra você ou surgiu ali na hora que você estava estudando a História do Cristianismo?
Rute: Surgiu quando eu lecionava História do Cristianismo. Eu lecionei essa matéria algumas vezes. E a gente estuda, faz o curso de Teologia, fiz Estudos Sociais, e a gente sempre estudando a história, estudando a história… não sei, parece que a gente não se toca muito que é uma história tão masculina! São grandes Reis, grandes Imperadores, os Papas… mas quando eu comecei a lecionar (principalmente porque eu gosto muito do tema da Reforma), quando comecei a falar sobre a Reforma, então era uma aula sobre Lutero, outra aula sobre Calvino… E eu comecei a me incomodar, eu falei: “mas…. não tem uma mulher aqui para representar esse movimento?” “Ou que fez alguma coisinha nesse movimento?” Então eu tava preparando aula sobre Calvino. e eu vi a trajetória dele quando ele sai fugindo lá da França, ele realmente foge, na época havia um processo de perseguição, tinha tido.um sermão que eles consideraram ostensivo… e então ele sai fugido, e ele encontra abrigo no reino de Navarra da rainha Margarida, que era irmã do rei da França, Francisco I. Esse rei Francisco I que teve as Institutas dedicadas a ele. E aí, quando eu vi (porque você não encontra em português essa história das mulheres. é muito pouco), quando eu peguei um livro que é a “História da Reforma” do D’Albine, (que aí são 6 volumes só sobre a História da Reforma), e ele falava bastante coisa sobre a história desta rainha, eu fiquei muito feliz! Eu falei: “tem uma mulher! Ela contribuiu, ela deu abrigo a Calvino!” E aí eu falei: “Eu posso pesquisar mais, eu posso partir disso e pesquisar mais!” Então foi muito boa essa descoberta, fiquei muito feliz, achei meu tema! Cheguei no mestrado com meu tema pronto, e ainda muita gente: “Não! Fala sobre a mulher na atualidade!” “Fala sobre isso…” Eu falei: “Não, eu quero falar de passado, atualidade às vezes me entristece!” (risos)
Então eu prefiro falar do passado, do que a mulher já fez, no que ela contribuiu. Aí eu comecei e não parei mais, porque escrevi a dissertação, virou livro,  e aí por conta própria já comecei o segundo, que é da época da Inquisição, e foi um emendando no outro, até agora!
Luciana: E quantos anos já tem o seu período de pesquisa desde o mestrado pra cá?
Rute: Até um pouquinho antes, eu diria que uns 20 anos já. Eu terminei o mestrado em 2003, que daria 15 anos, mas eu comecei a fazer o mestrado em 2000, e antes eu já comecei a pesquisar, buscar material, selecionar fontes… então quase 20 anos já de pesquisa.

Bianca: Como que é o processo de pesquisa para os livros? Você entra em contato com os temas, como você falou, através da literatura, encontrou o livro, depois encontrou o tema… mas o teu processo de pesquisa, pois geralmente você conta histórias que não foram contadas ainda, ou que existem poucos materiais ou materiais difíceis… então como funciona o seu processo de pesquisa, em qual idioma você encontra mais coisas… como que é isso?
Rute: Então, na nossa língua infelizmente (em português) o material é muito pouco, muito muito pouco. O do “Protestantismo Brasileiro” foi uma benção, eu adorei, porque eu tinha muito material em português, ele rendeu, ficou um  livro grosso, mas os outros é tudo mais pesquisa em inglês. Pro da Reforma foi francês, inglês e espanhol que eu pesquisei. E até avançando aqui, o livro mais desafiador de ser escrito foi realmente esse primeiro, porque ainda não tinha muito domínio do inglês, aí eu fui estudar, fazer um curso de inglês, comecei a traduzir… Eu pegava o material e traduzia, às vezes uma tarde inteira, traduzido algumas páginas. Aí eu digitava para poder rabiscar, para poder pegar a parte de melhor que eu achava… Mas no inglês o mundo se abre, a gente tem muitas histórias! Até mesmo a história da mulher que é menor que são menos relatos mas a gente acha mais coisa. Agora, no Português falta muito material, mas a gente começa não é…
Luciana: Alguém tem que começar!
Rute: É! Aí começa aos pouquinhos. Selecionando esse material, vendo o que a gente pode aproveitar, é um processo assim bem longo! O primeiro livro eu comecei praticamente em 2000. em 2004 eu fiz uma uma edição por conta própria, porque até o processo de encontrar editora também é muito difícil, para o escritor nacional e principalmente para a mulher. É muito difícil! E aí só em 2010, no final de 2010, praticamente o  livro tava pronto, que eu consegui a publicação da Hagnos, depois de tentar muitas e muitas editoras. Todo mundo gostava muito do material, mas sempre aquela questão: ‘nós não temos campo”, “não tenho leitor que vá se interessar”, “é mais acadêmico”, “é para um público menor”, “não é tão comercial”… Então foram muitos “nãos” que a gente vai escutando, até conseguir a publicação, que para mim foi uma benção, a editora Hagnos ter apostado numa escritora  Nacional, numa mulher. E esse livro acabou de esgotar, agora tá esgotado, é o segundo livro que esgota.
Luciana: Já pensou????? <ironia>
Bianca: Olha só! E pra quem não tinha campo… <ironia>

Luciana: Essa é fora da pauta, mas mas eu vou fugir um pouquinho: você chegou a ir lá in loco pegar os escritos originais ou foi mais pela internet mesmo, ou o pessoal te mandou material? Como foi?
Rute: Foi o seguinte: in loco mesmo eu trabalhei mais a questão do Brasil, que eu pude ver as pioneiras em Piracicaba, ir em museus, aí eu fiz uma pesquisa mais assim… Mas esses de Europa não consegui. O que eu consegui? Eu tinha, na época do meu mestrado, um colega que foi diretor da faculdade aqui de Campinas em que eu lecionei, fazendo o mestrado dele, ou doutorado, lá na Inglaterra. Então eu já tinha pesquisado os livros que me interessavam, as biografias, por que tinham muitas biografia da Margarida de Navarra. Então você pensa assim: “puxa, aqui no Brasil não tem nada…” De repente o que tem no Brasil é isso que eu escrevi no meu livro, ou alguns poucos parágrafos! Mas em inglês você tem biografias extensas, mas apesar de estar sempre nessa história positivista, que a mulher está acompanhada dos grandes Reis, dos Papas… Então você pega a biografia dela, de 400 páginas, em que 100 páginas falam diretamente dela! Tem isso também, né?
Bianca: Nossa!!
Rute: Mas eu lembro muito bem quando esse professor veio com o meu material! Eu enviei o dólar, enviei a lista, e ele chegou com xerox… Mas era uma pilha imensa de material em inglês, com as biografias até em francês! A minha filha sabe francês, ela me ajudou. Então, quando ele chegou em casa com aquela pilha que eu até falei: “gente como eu vou demorar para ler tudo isso!” Foi assim! Então biografia de 1.800 e nada, em inglês arcaico, difícil de entender… Então para quem tava começando praticamente, não foi fácil! Por isso que eu digo que o mais desafiador, foi realmente para pegar material inédito. Acho que em português o que eu tenho aqui é aquele texto que me chamou a atenção que é o “História da Reforma” do D’albine, esse realmente tem um volume.em que quase metade do livro fala da rainha Margarida de Navarra, fala do contexto do reinado de Francisco I, mas fora isso são parágrafos falando dela, então foi realmente um trabalho beeemm trabalhoso! <risos>

Bianca: E nessas histórias, principalmente dos reformadores, da Inquisição… Eu sempre acho que é tão difícil você encontrar mulheres com histórias contadas nesse período, algumas são mais recentes ainda. Se você vai procurar sobre mulheres na história do cristianismo você até encontra, mas mais recentes sobre isso. Agora os grandes nomes do cristianismo são nomes de homens… E a gente já sabe a resposta, mas a gente queria que você falasse um pouco sobre isso… Então na verdade é uma pergunta dupla: Porque que a gente não ouve falar dessas mulheres e porque que existiram menos mulheres nesse papel, nesse período?
Rute: Então, essa foi a minha questão, porque sempre quando você pensa num tema de dissertação, parte de um problema, e que você quer uma resposta. E aí a minha pergunta era essa: “Porque não se fala da mulher na história do cristianismo?” Duas razões: “Elas não tinham capacidade”, elas não fizeram nada, elas não exerceram influência nenhuma”, ou, “Não era relevante falar sobre elas”. Aí eu chego à conclusão que: “Não era relevante falar sobre elas”. Porque a história positivista, ela falava dos grandes Reis, dos Papas, dos Imperadores… e as mulheres, quando se falava das mulheres, elas eram associadas a esses grandes personagens da História. Então não era tão relevante falar da mulher, ela era discriminada, ela tinha o papel dela, a esfera dela e não envolvia a esfera pública da literatura, nada disso, então é realmente muito pouco citada. Mas, uma coisa linda que eu descubro a cada livro que eu escrevo, é que ela sempre atuou. Sendo falada, escrevendo, contando a história, sem contar… ela sempre atuou! Ela sempre exerceu influência, ela sempre evangelizou, buscou falar da Fé dela, do modo que ela podia, que ela conseguia, mas ela não ficou de braços cruzados. É muito gratificante você descobrir isso, né? Que desde o começo as mulheres atuaram. Este último livro eu meio que vou falar das mulheres no início do cristianismo, que foi até uma época interessante! Elas eram valorizadas, tinham as diaconisas, teve aquele grupo de mulheres que ajudou na tradução da Vulgata, ajudou Jerônimo,,, Então elas tiveram papel de maior destaque, porque a maioria dos cristãos daquela época eram mulheres, mulheres e crianças. E aí elas ocupam espaços, apesar de não ser de liderança, elas trabalham bastante, elas dão uma contribuição muito bonita no início do cristianismo. Aí depois a coisa pega outro rumo…
Luciana: Sim, infelizmente.

Luciana: No seu livro “Vozes Femininas no Início do Protestantismo Brasileiro”, você dedica alguns capítulos para falar sobre as vozes negras e indígenas que foram escravizadas e oprimidas. Qual que você considera o papel das mulheres negras e indígenas na formação do cristianismo?
Rute: Então, eu vou dizer pra vocês que eu não pesquisei a fundo a questão da mulher negra e da mulher indígena no protestantismo. O que eu fiz ali? Eu citei sobre as mulheres porque eu falei da escravidão, então eu cito essas vozes negras e indígenas. Agora, o que eu tentei fazer no livro? Eu ia fazer um capítulo inteiro sobre as vozes anônimas, e de mulheres que não aparecem mesmo, ou que aparecem às vezes com um artigo, até às vezes depois que elas morrem, com testemunho de vida, alguma coisa, e eu coloquei algumas negras que eu consegui pesquisar sobre isso, mas o livro tava ficando muito grosso. Então o que aconteceu? Eu peguei uma só pra representar todas. Até a próxima pergunta que vocês fazem aqui, sobre como resgatar histórias que muitas vezes não foram nem registradas. Então, uma história dessas que não foi nunca registrada, nunca saiu em revista, jornal evangélico, em lugar nenhum, é a homenagem que eu faço no final do livro às mulheres anônimas, em que eu cito a mãe de uma pessoa da minha igreja, que eu conheci os filhos que foram pastores, cantores… então eu falo dela. E aí foi totalmente a pesquisa de campo mesmo, de entrevistar o filho, de tentar descobrir alguma coisa porque não tem nada, nada mesmo e eu até queria mais disso. Mas aí o livro ia ficar muito grande e também ia ocupar muito tempo. Então a Maria Gomes de Lima, que é a mãe do Josué Nunes de Lima, Nelson Nunes de Lima, Onésimo… que foram os cantores, pastor, uma família muito bonita, foi assim: entrevistando uma pessoa da minha igreja, o filho Rubens de lima, e nessas histórias de mulheres anônimas que eu até já tinha escrito um pouco e descartei pro livro, porque o livro tava indo pra 700 páginas…
Luciana: Vish!
Rute: É! Eu acabei tirando, eu também tinha histórias de mulheres negras, de indígenas, tinha mais alguma coisa, mas eu falei: “realmente não vai dar, vai ficar muito conteúdo!” Então eu acabei tirando, mas quem sabe mais pra frente, se Deus abençoar, a gente ainda faz um livro só sobre isso!
Luciana: era a minha próxima pergunta! Se existe a possibilidade de ter uma parte dois das “Vozes Femininas no Protestantismo Brasileiro”…
Rute: Olha que podia! podia ter dois, três, quatro, cinco… <risos> Por que as mulheres continuam! As mulheres não pararam, elas continuam…
Luciana: Verdade!
Rute: Eu falo que hoje eu, vocês, nós, estamos fazendo a história do cristianismo, né? Então a história continua, mas vamos ver quem vai escrever essa história! <risos>

Bianca: E essa questão é muito interessante, por que a gente fala: “ah, a história são as mulheres brancas e tal”, e é uma questão tão complexa, né? Mas aí as mulheres negras acabam sendo ainda mais silenciadas, as indígenas ainda mais… Sendo que seus nomes não são nem citados! Então se a gente tem uma, duas, cinco, vinte representantes que vão aparecer na história do Cristianismo, que são mulheres brancas, e aí eu tenho as anônimas que fizeram MUITO pela gente. E até hoje a gente entra na igreja e a maioria são mulheres, a gente vê os números, visivelmente que são mulheres…
Rute: No meu livro, o último publicado, “Vozes Femininas no Início do Cristianismo”, eu falo das vozes inominadas, que até o tradutor do livro do Euzébio sobre a História do Cristianismo, ele escreveu vozes inomináveis, mas inomináveis tem uma conotação mais negativa, eu falei: “não são vozes inominadas, elas não foram nomeadas!” Então é tão interessante porque ele põe: “aquela mulher de Roma”, “algumas mulheres”… e a gente vê essa linguagem na bíblia, né? “A sogra de Pedro”, “a filha do centurião”, então não havia essa nominação das mulheres. Mesmo no império romano, a mulher recebia o nome da família, então a filha do Marco Túlio, era Túlia, se nascesse outra irmã, era Tulia segunda, ou a Tulia mais nova, ou a Tulia mais velha, então não tinha, a gente diz assim, uma “identidade”, né?

Luciana: Então, Rute, a gente pode perceber, durante todas a história do cristianismo, desde a Reforma Protestante, na Igreja Primitiva, e até na igreja atual, que a gente tem várias mulheres sendo capacitadas por Deus, nos mais diversos campos e das mais diversas formas. Quais que você acha que são as principais barreiras que essas mulheres encontram (me incluo nela também) para exercer plenamente as funções para as quais Deus tem nos capacitado, e quais são os principais prejuízos que a gente sofre em relação a isso?
Bianca: Que a própria igreja sofre!
Luciana: Exatamente!
Rute: Eu tenho uma frase que toda entrevista eu cito, e eu vou citar de novo: quando as mulheres não exercem seus dons espirituais, a igreja tem um prejuízo. W isso só a eternidade poderá aquilatar. Essa perda para o reino de Deus só pode ser aquilatada na eternidade. Realmente, as mulheres foram caladas durante toda a história, foram discriminadas, continuam sendo… Então são muitas barreiras, até hoje a gente encontra barreiras. Muitas igrejas não aceitam o ministério feminino, como se Deus não nos capacitasse. E eu sempre digo, outra frase que eu uso muito: Se é Deus quem capacita, (eu uso até meio uma paráfrase daquela visão de Pedro), não considere impuro o que Deus purificou. Então eu uso essa paráfrase dizendo: “não considere incapacitado a quem Deus capacitou”! Porque nós somos capacitados por Deus, homens, mulheres, crianças, jovens, todos somos capacitados por Deus. Então nós não podemos considerar incapacitados se é Deus quem dá o dom espiritual.
Luciana/Bianca: Sim!
Rute: E esse dom espiritual é dado independente da idade, do sexo, da escolaridade, da cultura… Deus dá os dons Ele dá uns dons, Ele capacita. E as mulheres têm encontrado barreiras sim para exercer plenamente essa função. Porque muitas vezes a mulher, se ela tem um dom área de música, ela tem algum espaço, como professora de criança, tem algum espaço. Mas se ela tem o dom de pregação, se ela tem o dom para lecionar mais adultos… já começa a ser visto de uma outra forma, então é uma luta, uma luta constante! Mas o que eu acho lindo, eu tenho muito orgulho de ser mulher, eu louvo a Deus por isso, porque eu percebo que as mulheres, vamos dizer assim, “não tão nem aí”! Estão trabalhando, elas vão fazendo, independente da permissão humana, elas procuram agradar a Deus. então isso é bonito! A mulher não fica com politicagem, com aquilo, um termo talvez não muito bonito, com “rabo preso”… por quê? Porque ela faz simplesmente pra servir a Deus, sem querer cargo, sem querer fama, sem querer honra, sem querer poder. Uma frase que eu repito e  repito é que o poder não é humano, o poder é divino. E o versículo de Pedro eu acho também muito forte quando ele diz que: Deus concede ao ministro não o poder, ele não está ali pastoreando como tendo poder sobre o rebanho, mas servindo de exemplo. É o serviço, é o modelo, não é o poder. Então isso pra mim diz tudo, não tem essa questão da autoridade, do poder, porque nós somos capacitadas por Deus, e para contribuir com o reino de Deus. Não é por nada mais do que isso! Então é muito importante refletirmos sobre isso: o poder pertence somente a Deus. O homem não tem poder nenhum, e muitas vezes quando a gente vê não se querer permitir, ou não se aceitar um dom espiritual de uma mulher, ou de um jovem, ou de quem quer seja, tem que se pensar nisso: que é Deus quem capacita, que não existe essa conotação de poder, mas de serviço, é para servir o reino de Deus, não é para governo! Muitas vezes se fala: “como que o marido vai ser submisso a uma mulher?”, a Bíblia diz que devemos ser submissos uns aos outros. E eu não encaro a mulher como também aquela autoridade em cima do homem, como não encaro o homem com essa autoridade, porque essa questão do Poder pertence a Deus, eu sempre repito: o Poder pertence a Deus.
Luciana: Amém!
Bianca: Amém! Tô arrepiada!
Luciana: Nem tem mais o que falar! <risos>

Bianca: Bom, pra encerrar o nosso papo, eu queria que você, Rute, contasse pra gente um pouco sobre os livros, a gente falou aqui sobre os livros, ficamos comentando deles, então se você puder fazer um pequeno resumo pra quem ficou interessado também, instigar a curiosidade do pessoal pra procurar os livros, a gente vai deixar também os links pra onde pode comprar os livros, e assim todo mundo pode ter acesso…
Rute: O primeiro livro, “Uma Voz Feminina na Reforma”, foi a dissertação de mestrado. O tema, eu sou apaixonada pela reforma, a reforma fez 500 anos, e eu vou dizer para vocês que.eu sou pioneira! Porque esse livro foi publicado em 2004, teve a edição da editora Hagnos em 2010, e em 2017 que comemoramos os 500 anos e que apareceram mais livros sobre mulheres, não sei se vocês acompanham isso, mas não tinha livros sobre as mulheres!
Luciana: Com certeza! Verdade!
Bianca: Sim!
Rute: Então fui pioneira num tema que me apaixonava e que eu sentia falta de falar sobre as mulheres. Então esse livro acabou de esgotar, está indisponivel na editora. Mas eu acho que ainda se encontra em Estante Virtual e em algumas livrarias ainda deve se encontrar. Os meus livros, só pra dar uma ideia, eles não são livros só falando das mulheres, são livros pra todo mundo! Porque em todos os livros eu faço o contexto da época, eu falo sobre o papel feminino, mas eu falo sobre a igreja da época, igual o do Protestantismo, eu falo sobre as denominações, sobre o império de D. Pedro II, então eu sempre dou esse contexto da época, eu falo sobre o papel feminino, e destaco algumas mulheres. Depois eu escrevi “Uma Voz Feminina Calada pela Inquisição”, que apresenta as Beguinas, mulheres que os maridos partiam para as cruzadas, e elas ficavam, cuidando do rebanho sem pastor, dos leprosos, das prostitutas, dos pobres, necessitados, então elas cuidavam desse povo e ensinavam a palavra de Deus na língua do povo. e essa voz que era calada pela inquisição ela paga o preço, ela é queimada na fogueira, porque ela ousa escrever, ela ousa falar, ousa pregar na língua vernácula, que era o francês. E ela não podia, ela só podia falar em latim, só que o povo não entendia o latim, então não havia mensagem! “Vozes Femininas no Início do Protestantismo Brasileiro”, esse esgotou primeiro, ele ganhou o Prêmio Areté, em história da igreja, em 2015, e nesse eu falo, é um livro mais grosso, que em português a pesquisa foi maior, eu dou muitas… é engraçado, quem já conhece meus livros, às vezes eu trago uma receita da época, eu falo da moda, então eu procuro a história da mulher que escreve diferente, eu procuro detalhes que não se acham tão facilmente, simplesmente em livros de história… então sempre tem um toque mais diferenciado. Nesse livro eu trago um jornalista da época que ele visita as igrejas, e ele discorre sobre o culto batista, o culto presbiteriano, o culto metodista, e ele chama de as “igrejas acatolicas, que não eram católicas, e eu falo dessa pesquisa que foi feita nessa época do início do protestantismo, das missionárias, das educadoras, e de tantas mulheres que foram tão importantes para nossa história. “Vozes Femininas no Início do Cristianismo”, trago o Império Romano, perseguição, igreja primitiva, papel feminino… Também falo das mártires, das diaconisas, daquelas que ajudaram na tradução da Vulgata… é um livro também bem gostoso, eu comparo muito aquela época de moralidade que havia com a época que a gente vive hoje, é bem parecido apesar de estar tão longe na história. E o último eu acabei de escrever, “Vozes Femininas nos Avivamentos”, ainda tá pra ser publicado, mas eu falo da Suzana Wesley, falo de mulheres que pregaram, que percorriam o país… Foi uma época de muita conversão, uma época muito bonita no século XVIII, que começa com depravação total também, mas da mudada por conta da pregação, por conta do pessoal aceitar o evangelho, e por conta dos avivamentos. Então também é um livro que acho que vai ser interessante pra conhecer o século XVIII e até início do século XX. É isso aí!
Luciana: Muito bom!
Bianca: E assim, eu espero que todo mundo que tá ouvindo esse podcast, que tá ouvindo esse episódio, se sinta inspirado não só pelas histórias dessas mulheres mas também pela sua história, porque como você falou, todas nós estamos fazendo história do Cristianismo e com certeza você está fazendo história do Cristianismo e assim, o sentimento que eu tenho hoje é de me sentir muito representada, por ter alguém que pensou na gente, ter alguém que pensou em contar essas histórias, e a gente sabe a importância de ouvir essas histórias, e de estar nas histórias, porque a gente se sente capacitada de continuar fazendo parte disso e saber que Deus tem agido através de nós.
Rute: Sem dúvida!
Bianca: E como você falou, mesmo sem o nome, sem o título…
Rute: Isso! “Aquela mulher de Roma”, “algumas mulheres por aí”… mas não importa nome, não importa cargo, importa é a contribuição para o reino de deus, por que é um trabalho que vai dar fruto eternamente…
Luciana: Amém.
Bianca: Sim, amém.

Luciana: E eu queria pedir pra Rute deixar uma mensagem pra quem tiver ouvindo o podcast, como incentivo mesmo, como encorajamento, porque às vezes a gente se sente tão desmotivada pelas nossas lutas, e às vezes a gente acha que “ah não vai dar certo”, tudo bem que esse podcast foi uma grande lição de motivação e encorajamento através da sua história e da história das mulheres que a gente debateu um pouco aqui, através dos seus livros, mas que você deixasse uma mensagem pra quem tá ouvindo o podcast, principalmente as mulheres…
Rute: Minhas queridas ouvintes: não desanimem nunca! Nosso trabalho vai ser galardoado! Com certeza nós fazemos para Deus, nós somos capacitadas pelo Espírito Santo. Então, se Deus te deu um dom espiritual, não enterre seu dom, não enterre seu talento! Trabalhe, com apoio, sem apoio, faça o que te vier à mão para fazer, porque o seu trabalho com certeza não vai ser em vão. E o que eu falo: não podemos dimensionar, mas a eternidade vai dimensionar isto, esses frutos vão para a vida eterna. Então não pare de fazer a Obra de Deus, continuem firmes nesse trabalho que é tão gratificante, porque é um trabalho espiritual, é o que nós temos de bem mais precioso aqui na terra!
Bianca: Amém.
Luciana: Amém! muito obrigada de verdade.

Rute: Deus abençoe vocês! À Luciana e Bianca, que a paz de Deus esteja com vocês, com todas as ouvintes, foi muito bom falar com vocês nesse dia, e para o nosso   Dia internacional da Mulher, que Deus abençoe a todos nós. cristãs, e que antes de ser mulher, nós sejamos cristãs, e façamos diferença neste mundo!
Luciana/Bianca: Amém!
Bianca: Muito obrigada pra quem ouviu até aqui e até o próximo episódio!

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End of Transcript

 

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